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A desconstrução de estereótipos e o conflito das classes em "Que Horas Ela Volta?"

Por:   •  31/5/2017  •  Dissertação  •  1.934 Palavras (8 Páginas)  •  282 Visualizações

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FACULDADE ESAMC UBERLÂNDIA

FLÁVIO RAYAN DE LIMA CHAGAS        R.A: 113438

TRABALHO DE RELAÇÕES ÉTNICAS E RACIAIS

A desconstrução de estereótipos e o conflito das classes em "Que Horas Ela Volta?"

Uberlândia – MG

Junho de 2016

Introdução

"Que Horas Ela Volta?" é um filme brasileiro lançado em 2015 que conta a história da pernambucana Val (Regina Casé) que deixa sua filha Jéssica (Camila Márdila) em Recife e vai para São Paulo tentar buscar melhores condições de vida. Val se tornou babá do Fabinho (Michel Joelsas) e mora integralmente na casa de seus patrões, que são da classe alta. Treze anos depois, quando Fabinho vai prestar vestibular, Jéssica pede ajuda à sua mãe para ir para São Paulo fazer a mesma prova. Jéssica é bem recebida até que a convivência complica graças às divergências ideológicas entre a família da patroa e Jessica.

Aparentemente estamos falando de um filme simples da dramaturgia brasileira. Na verdade, o filme faz uma forte crítica às desigualdades sociais e aos estereótipos como racismo, privilégios de elite, cultura do estupro, machismo, uso de drogas e inserção dos mais pobres nas universidades federais. Mesmo assim, no próprio filme podemos encontrar alguns destes estereótipos, como veremos no decorrer deste trabalho.

Apesar do conteúdo do filme em si já ser um material rico para debates e análises, neste trabalho veremos que o preconceito vai além do que nos é mostrado na tela, o que nos leva ao próximo item.

Os preconceitos e estereótipos atrás das câmeras

Primeiro precisamos falar da posição da mulher no longa. O filme é dirigido por uma mulher (Anna Muylaert) e tem três mulheres no centro da história: a patroa, a empregada e a filha da empregada.

Ao mesmo tempo que temos um reconhecimento para a quebra do estereótipo de que somente homens são protagonistas, ironicamente antes mesmo do filme ser lançado oficialmente, a divulgação dele sofreu com o preconceito dos homens, que numa coletiva de imprensa interromperam várias vezes a diretora do filme com comentários machistas, homofóbicos e gordofóbicos, como aponta o JC Online. Enquanto foram homens que fizeram isso, foram vistos como engraçados e piadistas por alguns.

A indústria do entretenimento vem tentado timidamente desconstruir alguns preconceitos contra as minorias como a homofobia e racismo, mas tenta fazer isso de uma forma que ainda fique vendável. Se ela fizer uma mudança muito agressiva, ainda há por parte dos produtores de entretenimento o medo da má recepção da sociedade.

No filme isso fica claro quando o papel da empregada nordestina, que passa por dificuldades é interpretado por uma atriz carioca, ao invés de escalar uma atriz nordestina de fato.

Quando dissemos que os estereótipos vão além do que vemos nas filmagens, podemos falar também do estereótipo do negro. Infelizmente na maioria dos conteúdos das novelas e filmes, os empregados ou pessoas que são mais pobres são negros ou pardos. Já no filme "Que Horas Ela Volta?", a empregada, por ser a protagonista, é branca. São raras as vezes que podemos ver um negro, pobre, sendo protagonista. Quando temos um negro no papel principal, as chances de ele já ser bem-sucedido na vida são altas.

O único negro que aparece no filme é um dos empregados da casa, cortador de grama. Na trama, ele junto com os outros empregados, passam a imagem de pobres e “mortos de fome”. Durante as aulas vimos como isso foi construído ao longo da história.

Um exemplo fora do filme, é como a mídia querer retratar o sofrimento que os homossexuais passam com a homofobia, mas colocam um ator heterossexual. Além da mídia, acontece muito isso no governo também, quando nossos governantes governam para eles mesmos, com os ideais deles e não com os ideais do povo, colocando um representante de cada causa para lutar por ela.

A partir de agora, veremos então o que acontece dentro do roteiro do filme, e percebemos que ele foi além de uma crítica social, mas sim um filme que também utiliza dos estereótipos da sociedade para a mídia de massa.

“Você é praticamente da família”

“Você é praticamente da família”, diz Bárbara, a dona da casa, para a Val, empregada e babá do já adolescente Fabinho. Bárbara é uma mulher rica, elitizada, aparentemente independente e com temperamento rude. Não viu o filho crescer, o qual foi criado pela babá. Já nos primeiros minutos de filme percebemos uma característica da época da abolição da escravatura. O pensamento enraizado na cabeça da patroa é usado como um sinal positivo para Val, mas que na verdade só beneficia a patroa. Val sempre foi somente uma funcionária e ela está dentro da casa da família, inteiramente a dispor deles apenas para servir.

“Quando a emancipação de uma mulher é resultado da transferência do trabalho doméstico para outra mulher, não pode ser vista como emancipação real.” (LIMA, 2015)

A ideia do homem no poder

Com a câmera estática na cozinha mostrando a refeição da família na mesa, após uma discussão sobre o uso de maconha, Bárbara, que encontrou a droga na bolsa de Fabinho, questiona o adolescente sobre aquilo ser dele ou não. Após ele negar, ela aceita suas desculpas e a joga fora, sem alarde algum. Após isso, Val recolhe os utensílios sujos na mesa e serve uma sobremesa, enquanto Bárbara também levanta e ajuda.

Em todas as refeições, apenas as mulheres ajudam a limpar. O fato de o filme tentar desconstruir o machismo, não significa que ele vai mostrar um exemplo de como deveria ser uma família politicamente correta. Mas temos a observação de que no jantar, a comida é servida para todos e que no final só as mulheres recolhem os pratos e tiram a mesa enquanto os homens não fazem absolutamente nada, é que mostra como a sociedade é machista, mesmo que em pequenos detalhes, e ainda mantem o idealismo de que o homem no poder ainda está presente. Conforme fomos vendo na construção da sociedade, a “superioridade” do homem é que deve ser sempre servido por mulheres ou empregados, pessoas inferiores a ele.

A situação piora quando o homem da casa assedia Jéssica, numa clara tentativa de sedução. É a cultura do estupro que sempre existiu, onde as mulheres são vistas como uma subcategoria, ou até mesmo como coisas. E isso vem de uma sociedade patriarcal e um reflexo do machismo sobre a participação da mulher na sociedade.

Mesmo aparentemente Bárbara sendo uma mulher socialmente bem escalada, com um emprego bom e um bom salário, que aparentemente sustenta toda sua família, o filme apresenta outro lado do patriarcado, que mesmo colocando o homem em posição de "sustentado pela família" ainda tem certo "poder" em casa, quando não faz nada para ajudar e só dita ordens aos empregados.

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