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Processo Estrutural Sergio Arenhart

Por:   •  12/8/2021  •  Bibliografia  •  29.717 Palavras (119 Páginas)  •  251 Visualizações

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1. Premissas gerais

1.1. Técnica processual e tutela dos direitos

Há muito tempo o processo deixou de ser visto como figura autônoma e insensível aos problemas reais, para ser enxergado como verdadeiro instrumento de atuação na realidade. Por outras palavras, de nenhuma serventia é o processo se ele não consegue dar conta dos problemas da vida concreta com que almeja lidar.

Por isso, muito mais importante do que examinar os institutos internos do direito processual, é fundamental prestar atenção nas relações estabelecidas entre esses institutos e as situações materiais carentes de tutela. Um processo só se legitima se puder dar conta dessa realidade, prestando resposta adequada, tempestiva e efetiva a essa realidade, sempre observando as garantias processuais fundamentais das partes. Trata-se de uma leitura do direito processual à luz do texto constitucional e, em particular, das garantias fundamentais – tais como a garantia do acesso à Justiça (art. 5º, inc. XXXV, da Constituição), do devido processo legal (art. 5º, inc. LIV, da Constituição), do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, inc. LV, da Constituição) e da duração razoável do processo (art. 5º, inc. LXXVIII, da Constituição). Se essas normas são garantias fundamentais, então devem iluminar todo o sistema jurídico, impondo às regras processuais interpretação que ofereça a esses valores a sua maior densidade e mais ampla aplicabilidade.

Por essa razão, não se justifica mais a interpretação isolada das regras processuais, como se pudessem estar divorciadas daqueles valores e da realidade a que se destinam. As regras do processo só podem valer legitimamente se e quando cumprem sua missão constitucional e aderem, de fato, aos problemas da realidade a que devem servir.

Com essas considerações, fica fácil notar que o processo não é um dado, mas um construído. Deve ser construído à luz das circunstâncias concretas do problema a ser enfrentado e da realidade do direito material a ser atuado. Logo, pensar o direito processual em abstrato constitui um grave equívoco. É necessário conceber o processo para o caso e à luz do caso. É nesse sentido que se diz que a técnica processual deve estar a serviço da tutela dos direitos. A técnica processual, sozinha, é nada. Só adquire valor e importância à medida que se alinha às necessidades do direito material e dos valores fundamentais postos na Constituição.

Para iniciar a exposição das diferentes particularidades dos processos estruturais, parece necessário recuar um passo para permitir algumas importantes elucidações teóricas. Em resumo, essa área, complexa, multipolarizada e policêntrica, com violação sistemática a direitos e garantias fundamentais inerentes (conceitos que serão abordados ao longo do curso), passa a ser a condição de existência de um processo que abarque sua extensão para resolução futura do problema apresentado, o que será desenhado a partir das técnicas para tutelar o direito que se quer proteger. Por isso, opta-se em iniciar, mesmo que com alguma brevidade, com os conceitos de tutela dos direitos e das técnicas processuais.

O debate em questão rendeu grandes discussões no campo doutrinário nos últimos anos, tendo sido tão profícuas que o Código de Processo Civil aborda o tema textualmente em algumas oportunidades diretamente, e, em muitas outras, indiretamente. É a partir da referência teórica adotada que se poderá, naquelas que não estão identificadas no texto, extrair a ideia de que se trata de uma técnica processual ou da própria tutela do direito. Antes de conceituar cada uma, navega-se por alguns artigos positivados no diploma processual.

Um dos dispositivos em que facilmente é identificada a técnica processual é o inovador 327, § 2º, cuja redação inicia no caput com “É lícita a cumulação, em um único processo, contra o mesmo réu, de vários pedidos, ainda que entre eles não haja conexão”, e finaliza no parágrafo, afirmando que, “quando, para cada pedido, corresponder tipo diverso de procedimento, será admitida a cumulação se o autor empregar o procedimento comum, sem prejuízo do emprego das técnicas processuais diferenciadas previstas nos procedimentos especiais a que se sujeitam um ou mais pedidos cumulados, que não forem incompatíveis com as disposições sobre o procedimento comum”. O artigo tem a propriedade de transferir técnicas processuais diferenciadas, que não estão apenas elencadas nos procedimentos especiais do [pic 1]CPC, mas também em leis esparsas, para dentro do rito comum, comunicando-se com ele, desde que não incompatíveis. O artigo em comento tem ares tão renovatórios que gerou, por parte da doutrina, defesa específica como uma das mais importantes diretrizes do [pic 2]CPC, como verificam Fredie Didier Jr, Antônio do Passo Cabral e Leonardo Carneiro da Cunha.1 Com a atenta leitura do identificado enunciado, podem-se identificar os traços característicos do que é a técnica processual que será mais bem entendida mais à frente.

Já num outro ponto do [pic 3]CPC está elencado como forma de tutela dos direitos praticamente todo o Livro V da Parte Geral, que trata do tema das tutelas provisórias de urgência e de evidência, inseridas entre os artigos 294 a 311, assim como em locais esparsos do Código, como no artigo 1.015, que trata de sua recorribilidade pela via do agravo de instrumento e outros que poderiam ser aqui lembrados, como o próprio art. 9º. Note-se que, apesar de o Livro fazer alusão à tutela provisória, não se pode colocar uma venda e acreditar que tal tutela não se concretiza por meio de uma técnica específica, a depender do tipo de proteção que se queira dar ao direito anunciado. Registra-se o alerta: não é o legislador do processo civil que outorga direito à tutela do direito, pois ela já pertence ao campo do direito material.2 Nas palavras de Luiz Guilherme Marinoni,3 compete à história do direito, embora com relevante importância, a doutrina que acredita que o direito material não importa na construção do direito processual, assim como o pensamento existente de um procedimento único, destituído da técnica da antecipação de tutela, mostrando que há técnica envolvida naquilo que o CPC denomina de tutela.

Mais adiante,4 apreciando a relação entre técnica processual e tutela do direito, Marinoni acaba por afirmar sua diferenciação, ao afirmar que a tutela está intimamente ligada à proteção do direito, devendo ser amoldado o processo para melhor protegê-lo, razão pela qual é ele – o processo – a técnica para prestar a tutela do direito. Para Carlos Alberto Alvaro de Oliveira,5 a tutela jurisdicional está vinculada à noção da atividade estatal visando à proteção do patrimônio jurídico. Já a técnica processual6 pode ter várias acepções, tendo em vista a sua polissemia, servindo-se o processo da técnica com caráter instrumental.

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